sábado, 13 de dezembro de 2014

Um dia no topo



Fonte: Super Esportes.com.br
Texto: Ivan Drummond /Estado de Minas
Fotos: Arquivo / EM DA Press (Google)
Edição: Jorge Luiz da Silva.
Salvador, BA (da redação itinerante do Esporte Comunitário)


Conquista do Siderúrgica veio com a vitória por 3 a 1 sobre o América, na Alameda

Último título do Siderúrgica, que superou oponentes como Atlético, Cruzeiro e América, completa 50 anos hoje. Desde então, time passou por crises, fechou e tenta se reerguer


O dia 13 de dezembro de 1964 é uma data que o futebol de Sabará leva no coração.
O time da cidade, o Siderúrgica, conquistava pela segunda vez o título mineiro – a primeira foi em 1937 –, ao vencer o América por 3 a 1, no Estádio Otacílio Negrão de Lima, a Alameda. O título completa 50 anos hoje.

Sua história começou um ano antes, com a contratação de Dorival Knipel, o Yustrich, que chegou ao clube em 1963 para salvá-lo da degola no Campeonato Mineiro – e conseguiu. Era dado ali o primeiro passo para a montagem do grupo campeão do ano seguinte, que derrubaria gigantes como o Coelho, Atlético e Cruzeiro.


O Siderúrgica pertencia aos funcionários da Belgo Mineira, uma indústria do setor de siderurgia instalada em Sabará. Foi fundado em 1932. A empresa, informalmente, era uma espécie de patrocinadora.

E com o aval da companhia, Yustrich foi contratado. Tinha carta branca. Acabou com a antiga concentração, precária. Retirou camas e colchões, empilhou na rua e ateou fogo. Depois, mandou construir um casarão. Até aí, os atletas se beneficiavam dos empregos da Belgo.

Os jogadores vinham atraídos pela fábrica e acabavam indo para o time. Trabalhavam até as 15h e tinham permissão para treinar. Silvestre, atacante, era da minha sessão. O Ernane, ponta-direita, era soldador. Mas, com a chegada do Yustrich, isso acabou. Ernane, Silvestre, Chiquita e Geraldino tiveram de tirar licença”, conta Raimundo Arnaldo Duarte, de 74 anos, criador da charanga. “A gente era do bloco de carnaval Entendentes do Samba. Nossas cores também eram, como o time, azul e branco.”


O goleiro Dejair tinha chegado do Rio de Janeiro, do juvenil do Flamengo, em 1956, levado por outro treinador famoso, Martim Francisco, o inventor do 4-3-3. Os laterais-direitos eram Zu e Geraldino. Os zagueiros, Chiquito e Zé Luís. O lateral-esquerdo, Dawson, estudante do Colégio Arnaldo, de Belo Horizonte. O meio campo tinha Édson, Noventa e Paulista. O ataque, Ernane, Aldeir, Silvestre e Tião. Aldeir, tinha sido comprado do América do Rio, mesmo estado de onde Tião viera.

Dejair, hoje aos 76 anos, não se esquece da preleção feita pelo técnico no primeiro treino de 1964, em janeiro. “Ele disse que ia nos treinar para sermos campeões. E gritava: ‘Não aceito perder’.”

Aldeir, autor de um dos gols da vitória por 3 a 1 sobre o América – os outros foram de Silvestre e Ernane, todos no primeiro tempo, contra um de Jair Bala, no segundo –, conta que foi para o Siderúrgica em 1962. “Eu estava no América do Rio. Um dirigente foi lá e disse aos diretores que queria um jogador. Disseram que o único disponível era um doidinho. Era de mim que falavam. Acabei vindo. Em Sabará, joguei muito, fazendo gols. Mas acabei brigando com um treinador – não me lembro do nome – e fui embora. Quando o Yustrich assumiu, disse que precisava de um atacante. Aí, se lembraram de mim. Ele foi me buscar.”


Aldair, que confessa ter sido temperamental, se tornou fã de Yustrich. “Ele sabia conversar com cada um. Desde a conversa erudita até a popular. Assim, ele ganhou o grupo. E deu no que deu. Fomos campeões.” No jogo decisivo, ele começou na reserva e substituiu Noventa, que levou um chute na cabeça, quando o placar era 2 a 0. Fez o terceiro gol. “A gente tinha apenas um jogo a fazer. Estávamos dois pontos à frente do América. Jogaríamos por um empate. O Yustrich me disse: ‘Vou te treinar para levar pancada. Eles sabem que você é meio time e vão querer tirá-lo de campo. Se te esbarrarem, grita e cai no chão’”, conta. E diz que fez tudo certinho.

Ao fim, na festa do título, acabou vivendo uma história diferente da dos demais jogadores. Yustrich mandou o motorista do ônibus com os atletas tocar para o hospital onde Noventa tinha sido atendido. “Eu não sei por que, mas não entrei no ônibus. Peguei um táxi e fui para Sabará, ainda de uniforme, sujo e de chuteira. Estava todo mundo na praça, festejando. Fui carregado. Somente depois o ônibus chegou.”

Em 1965, pela Taça Brasil, atuando no Mineirão, o Siderúrgica passou pelo Atlético-GO. Chegou às oitavas de final, mas foi eliminado pelo Grêmio. A lua de mel terminaria pouco tempo depois. Yustrich foi embora, como os principais jogadores, transferidos para América, Atlético, Cruzeiro e Villa Nova. A dívida para a formação da equipe campeã era muito grande. A Belgo Mineira pagou tudo e depois não ajudou mais. Em 1967, o time fechou as portas.

Geraldo Evangelista da Fonseca, de 65 anos, é o atual presidente. Ele conta que por várias vezes o time tentou voltar, disputando torneio de base e o Mineiro da Terceira Divisão. Mas não há dinheiro. As categorias de base ainda existem, mas não podem treinar no Estadinho da Praia do Ó. Seis equipes das categorias pré-mirim, mirim, infantil e juvenil treinam no campo de uma escola estadual. Algo bem distante de ser ao menos uma sobra do time que há 50 anos levantou a taça de campeão mineiro.


Em festa

Com portões abertos, o Siderúrgica faz às 15h de hoje, em seu campo, jogo em comemoração aos 50 anos do título mineiro, contra o Guará, equipe amadora de Sabará. O time sabarense será formado por ex-jogadores que atuaram nas divisões de base.

Enquanto isso...

…ajuda demorada

O descaso da Prefeitura de Sabará com o Siderúrgica vem de longa data. Somente agora algo tem sido feito pela equipe. Em 1972, numa permuta com a Belgo, o poder municipal repassou-lhe o terreno do Estádio da Praia do Ó em troca de outro, onde funcionava o matadouro.

Em 1986, a área foi desapropriada para instalação da Faculdade de Educação Física da Universidade de Sabará, mas o projeto não andou. Em 1990, o Siderúrgica conseguiu reaver o espaço e voltou a ter um time, disputando o Módulo 2 do Mineiro, sem nunca engrenar. Agora, está sendo revitalizado o sistema de drenagem, semelhante ao do antigo Mineirão. “Temos de desentupir canhões de água e estamos recuperando a parte da computação”, diz o prefeito Diógenes Fantini, ex-presidente do clube. A iluminação terá de ser refeita, e a grama, trocada. “Estava tudo entregue às moscas, arruinado.”

 Linha do tempo

1930 – Clube é fundado em 31 de maio
1932 – Estreia no Campeonato Mineiro da 2ª Divisão
1933 – Disputa o primeiro Campeonato Mineiro de Profissionais
1937 – Campeão Mineiro
1964 – Campeão Mineiro
1967 – Time fecha as portas
1972 – Perde o Estádio da Praia do Ó
1990 – Acordo possibilita a devolução do campo e a remontagem do time
1993 – Volta ao futebol profissional
1997 – Disputa a 3ª Divisão do Mineiro
2005 – Sem ajuda, volta a fechar as portas





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